O ano 2020 terá uma inequívoca protagonista: a tributação. Há consenso de que o sistema atual está ruim e precisa ser melhorado. A partir daí, muitas divergências. Há a PEC n° 45/19 na Câmara dos Deputados, tendo recebido 219 propostas de alteração. Há a PEC n° 110/19 no Senado Federal e que recebeu 116 propostas de alteração. Em algum momento deste ano, todas estas propostas de alteração se encontrarão democraticamente. Além dessas propostas, há a iniciativa anunciada pelo governo federal e que deve ser apresentada no início deste ano. Em comum, as propostas objetivam simplificar o sistema, melhorar a redistribuição de renda e criar uma tributação mais justa, sempre com a promessa de não aumentar a carga tributária. As bases econômicas sobre as quais recaem os principais tributos em debate são o patrimônio, a renda, o consumo e a folha de salários. fortunas, além da imposição de IPVA sobre aeronaves e embarcações. Todas estas iniciativas podem ocorrer no plano infraconstitucional. Tem como apelo o aumento da tributação sobre os mais ricos. De outro lado, os tributos sobre o patrimônio tem uma menor importância arrecadatória. Se excessivo, estimulam uma maior fuga de patrimônio do país. O desgaste político é grande e o retorno é desproporcional. No âmbito da tributação sobre a renda, o foco deve ser a tributação sobre os dividendos. Sob a perspectiva de justiça tributária, a tributação da renda tende a ser mais progressiva, alcançando mais intensamente os que mais ganham. É a segunda grande base de arrecadação. A tributação dos dividendos tem forte conotação eleitoreira, pois encampa o discurso de tributar os capitalistas com o (equivocado) discurso de aumentar a arrecadação. É, antes de tudo, uma questão de concorrência internacional. Em 2017, os Estados Unidos diminuíram a tributação das empresas para o patamar de 21 %. No Brasil, tributamos a renda das empresas na faixa de 34% sobre o lucro. Vale dizer, se pretender tributar os dividendos em 15% – que é a mesma renda já tributada nas empresas – deve-se reduzir a tributação das empresas para a faixa de 20%. Caso contrário, a tributação da renda em 34% nas empresas, somadas à tributação dos dividendos em 15%, alcançaria a casa dos 49%, deixando o país fora dos planos de novos investimentos. Haveria fuga de empresas e inibição de novos projetos. A distribuição de dividendos seria postergada e as pessoas físicas transferiríam muitos gastos para a pessoa jurídica. A arrecadação cairía e as empresas buscariam novos domicílios com tributação sobre a renda minimamente aceitável. É mais fácil e eficiente tributar uma só vez nas empresas. O tema também pode ser tratado por simples leis ordinárias. No campo do consumo. a questão é mais dedicada. São tributos mais regressivos (injustos com os mais pobres), cobrados pela União, Estados, Distrito Federal e municípios. Alcançam produtos industrializados, comercialização de bens, prestações de serviços e operações diversas com distintas bases de cálculo e alíquotas. Respondem pela maior parte dos conflitos tributários. É sobre esta categoria que se debruçam a PEC 45/19 e a 110/19 acima mencionadas. Pela PEC 45/19, além de um tributo seletivo sobre tabaco e bebidas, pretende-se unificar cinco tributos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS), criando-se o imposto sobre bens e serviços (IBS), sendo gerido por todos os entes da federação de forma centralizada em um órgão por eles composto. Sugere uma alíquota uniforme, não- cumulatividade plena, fim dos incentivos fiscais e mudança para o critério de destino, alinhando-se aos padrões dos países mais desenvolvidos. Desonera investimentos e exportações. Haveria uma grande simplificação. Pela PEC 110/19, pretende-se unificar 7 tributos federais (PIS, Cofins, IPI, IOF, Cide, salário educação e CSSL), além do ICMS e ISS. Seriam substituídos pelo mesmo IBS. Propõe várias alíquotas e um imposto seletivo abrangendo tabaco, bebidas, veículos e alguns insumos como combustíveis, energia e comunicação. Admite incentivos fiscais para medicamentos, transporte público, bens do ativo, saneamento e número de alíquotas e de benefícios fiscais, o que pode desnaturar a intenção de simplificar. No que diz respeito à folha de pagamento, pretende-se desonerá-la, estimulando a geração de empregos e a contratação formal de mão-de-obra. Não se sabe qual seria a fonte de custeio em substituição, já que os tributos sobre movimentações financeiras estão sendo descartados pelos Poderes Executivo e Legislativo. Restaria, em substituição à tributação da folha, aumentar a tributação sobre a renda ou sobre o consumo, o que seria de difícil aceitação. É um nó a desatar. O governo federal sinaliza com uma contribuição sobre valor adicionado federal, agregando o PIS e a Cofins. Manteria o IPI seletivo em restritas hipóteses. Também promete tributar dividendos com redução progressiva do IR das empresas e indica esforço para solucionar a redução da tributação sobre a folha. Em algum momento deste ano, todas estas propostas se encontrarão democraticamente, mas qualquer mudança aprovada produzirá efeitos a partir do exercício seguinte, ou seja, 2021.
Fonte: valor.globo.com ( artigo assinado por Eduardo Salusse – sócio de Salusse, Marangoni, Parente ejabur Advogados, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA)